30 outubro 2007

Talvez...

Talvez a verdadeira intimidade eu só tenha buscado com as palavras, e tenha me entupido delas no momento em que poderia estar aprendendo alguma coisa com alguém. (Faço um muro de palavras entre mim e as pessoas. Sou auto-explicativa só para confundir.)
Talvez eu tenha nascido para uma vida desapaixonada e culta. Talvez eu nunca tenha olhado verdadeiramente o outro, e só tenha visto o texto pronto que criei para ele. Talvez eu não conheça o que julgava conhecer. E isso me entupiu de certezas que eu não soube abandonar ao longo do caminho.
Uso palavras para não sofrer, para plagiar uma dor, para fingir que sou leve e que está tudo bem. Uso palavras para falar de uma chuva que talvez eu não conheça porque ele não me permitiu ficar encharcada dela. E ela virou a metáfora de um relacionamento que pode ser tristemente poético.
Talvez eu só tenha sentido saudade para falar de outras coisas. Para usar a palavra "saudade" mesmo, que eu adoro. Acho que estou muito cansada. Falei demais das coisas e, no entanto, não toquei verdadeiramente em nada. Observei e descrevi, cheia de filtros semânticos. Dentro da minha limitação eu interpretei o Universo para que eu coubesse nele, em mim. E alienei as pessoas dentro de conceitos. E arranjei um sentimento para cada coisa. E pensei que assim, tudo estaria em ordem, sob controle. Eu que me julgava não julgadora, me considerava livre, agora tendo que empurrar as grades dessa prisão de certezas que criei para mim. Sem poder culpar ninguém. Usando um discurso de alguém que dizia que não queria magoar o outro para descobrir que no fundo só se importou consigo mesmo e com os meus medos. Ele não deixou que eu experimentasse o que havia de melhor ou de pior nele. Não deixou que eu escolhesse. Manteve o muro de palavras e um discurso pronto para continuar a salvo do outro lado. E eu... que sempre falei de pontes...
Talvez eu seja virtualmente inacessível. Alguém que se entope de adjetivos para entender as coisas e dizer que não se preocupa em entender nada. Eu sempre falei de amor, e continuo amando ele em toda a dimensão da pessoa que ele é.
Talvez eu só tenha dançado para fingir que gostava de música. Talvez eu só tenha bebido para fazer parte de um círculo social. Talvez eu só tenha aceitado certas coisas para poder ser chamada de amiga. Mas não me apaixonei para fazer parte do círculo de pessoas que sorriem falsamente dizendo que amam quem não amam mais... minha paixão por ele é invejável...
Talvez eu escrevo para dominar a minha dor na escrita.
Acho que estou realmente cansada. Falei demais sobre tudo e continuo no escuro. E a minha recusa em tocar nas coisas me impede de sair tateando em direção à luz. E mais uma vez eu uso palavras para tentar me defender de algo, de mim.
Talvez eu só tenha escrito isso tudo para conseguir chorar... E usar a palavra "talvez" pode ser o início do abandono de tantas certezas; o início do uso mais corriqueiro da frase "eu não sei".
Talvez isso seja um começo de alguma coisa.
Talvez isso seja um fim.
Talvez sejam apenas hormônios...
Mas isso tudo se parece muito com tristeza...
EU NÃO SEI.
*
EU SOU ESTAS RETICÊNCIAS ENTRE PARÊNTESES: (...)
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Não aprendi a empinar pipas, mas a empilhar frases. E tive que me familiarizar com desmoronamentos. Por isso, procuro palavras regeneradas que façam algum traço de cor no céu. Eu não aprendi a desenhar fatos novos, mas a restaurar letras encontradas em entulhos e paisagens adoecidas pelo tempo. Às vezes, entre os destroços, eu descubro paradoxos como um mar de águas-vivas mortas. Às vezes, entre os escombros, eu recupero uma alegria virando pelo avesso a tristeza empoeirada. Um dia, eu reconstruí um poema apenas com os detritos de uma flor. E ressuscitei uma metáfora que estava dentro de uma frase irrecuperável...
Minha poesia nada mais é do que a tentativa de resgatar
essas emoções soterradas.
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Às vezes me perguntam...
- Rê, o que você faz quando está muito triste e cansada, mas não consegue dormir?
E eu sempre respondo...
- Eu componho um pranto.