10 fevereiro 2008

Eterno retorno

"E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: "Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez - e tu com ela, poeirinha da poeira!".» Nietzche



Dei de cara com esta teoria filosófica postulada por Nietzche. A princípio, achei um tanto quanto difícil. Agora me arrisco a entender. Existem alguns acordes, sons e notas repetindo-se ao longo da partitura de nossa existência. São fatos acontecidos no passado, vividos no presente e que indefinidamente se repetirão. Você poderá chamar de legado, encanto ou maldição, depende da sua percepção. Para outros: destino, acaso, sinais.

O pensamento mágico, a surperstição, às vezes, dão razão às nossas escolhas. Nieztche usa a expressão Amor fati: amor ao destino. Estamos presos a uma cadeia ilimitada de fatos, através de um ciclo atemporal que repete-se infinitamente até a eternidade. Instâncias alternadas indefinidamente. Na Psicologia Familiar podemos analisar, através da árvore genealógica da família, padrões de repetições nos comportamentos e fatos de familiares em várias gerações, podendo ser explicados além da hereditariedade.


Uhmm compliquei mais a situação. Escrevo, escrevo e não saio do lugar. Pois, então, esta teoria tem haver com as decisões da vida, desde as mais simples, como escolher uma roupa para a festa, qual caminho tomar ao voltar para casa. Até as mais difíceis: largar ou não aquele emprego chato? Terminar ou não o namoro de anos? Ou isto ou aquilo? Pergunta altamente filosófica da Cecília Meireles em seu livro infantil. Não tem meio termo. Cada escolha feita, desemboca em uma série de infindáveis conseqûencias, resultadas do ato, impensado ou não.


Deste pensamento, brota a seguinte reflexão. Se eu não estou satisfeito com o meu trabalho e não pedir demissão, estou fadado a eternizar estes momentos de frustação e angústia com a situação, porque é esta a minha atitude agora: a omissão, acomodação. Já imaginou passar a eternidade fazendo exatamente o que você faz agora?

A sociedade impõe a estabilidade como padrão de comportamento para a pessoa bem-sucedida. Com a instabilidade do mercado de trabalho, quem não quer ter hoje em dia: emprego fixo (se for concurso público, então!), monogamia, casa própria, vida tranqüila e estável? Esta busca pela estabilidade, atrái a instabilidade da alma. Alguns preferem não fazer escolhas por medo de perder a vida "estabilizada", estacionados no "agora" e amortecidos com a ilusão de segurança. Na ânsia por obter prazer, você acaba prolongando a sua dor. E estender seu sofrimento, traz mais sofrimento. É matemática pura. Isto nos dá a consciência da imensa responsabilidade por nossos atos.

Às vezes, é mais fácil culpar o destino, o pesado fardo, o azar, o feitiço da bruxa má, o santo, o mau olhado, maldição de família, a inveja dos outros, do que admitir a sua inércia e inanição diante da vida passando. Não digo admitir sua escolha errada, porque afinal, não existem escolhas erradas. Existem os caminhos mais longos e os atalhos. Qual deles tomar, depende da sua decisão. Mas qualquer que seja a sua alternativa, o "destino" será o mesmo. Você escolhe a forma do aprendizado. A dor e o amor estarão juntos em qualquer estrada. Tomar a pílula azul ou vermelha? Ou então siga a estrada de tijolos amarelos...

A intensidade é a minha marca registrada. Meus 30 anos é a minha intensa idade. Tomei decisões que aos olhos de muitos foram impensadas, tresloucadas, precipitadas, imaturas. Sempre com o desejo de ir além daquelas amarras que me prediam no agora, de viver tudo intensamente, me embriagar até cair no chão... beber o veneno até a última gota... Sempre a um passo a frente, mas atrás do desconhecido ou do proibido (como quiserem). Quente e distante, feito uma estrela cadente. A provar do doce e do amargo, definir o sabor. O climax desta intensidade teve um preço jamais pago.

Por algum tempo vivi o falso conceito da estabilidade. Larguei o emprego estável e a casa mobiliada. Resolvi jogar tudo para o alto, em busca do pote de ouro no final do arco-íris. Se eu não achar o pote, pelo menos verei as cores. Se vai dar certo ou valerá a pena, cabe a mim decidir, não aos outros. Se eu sempre vou embora é para eternamente voltar.


Mas não se esqueça, tuas escolhas de hoje, podem repetir novamente em outras vidas, e assim sucessivamente, sem fim. O que passou vai acontecer novamente quando aqui retornar, não tem como mudar o que passou, então reflita se o que você quer para teu hoje, e teu amanhã, seja eternizado.

Você é o seu Deus, você é o seu acaso, você é o seu destino.
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Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros.